segunda-feira, 14 de julho de 2014

A seleção alemã

O papo do dia é a seleção alemã. Era uma das favoritas da Copa. Trabalharam duro, ensaiaram jogadas, armaram o time e fizeram tudo aquilo que os analistas de futebol já prosearam pela imprensa pra explicar a conquista da taça. Mas foi a atuação fora de campo que surpreendeu - e encantou - o brasileiro.

Foto: Fifa

Não foi surpreendente escolherem a acalorada região do sul da Bahia, para construir o centro de treinamento? Enquanto os alemães se esbaldavam no calor baiano, a seleção brasileira batia queixo na germânica Teresópolis. Souberam se relacionar com o povo local - inclusive com os índios - e foram flagrados diversas vezes cercados de crianças. A língua não foi barreira. No final das contas, gente é tudo igual, feita da mesma massa divina. E os loiros alemães incluíram na alegre celebração da vitória no Maracanã uma dancinha com inspiração indígena, mais brasileira impossível.



Sorriram. Para quem imagina o alemão como um povo de cara amarrada, o sorrisão deles ao longo da Copa - com as famílias, a imprensa, nos gols - foi surpreendente. Até a sra. Merkel, que veio de longe para testemunhar a vitória alemã, deu um sorriso, um beijo e um abraço em cada um dos homens da longa fila de jogadores, reservas e comissão técnica.

(Foto: Dawn)

Pra terminar, tem o goleiro Manuel Neuer, considerado o melhor da copa em termos futebolísticos. Mas a muralha loura conquistou também o radar das brasileiras - dizem até que Maitê Proença, referência na grande área, teria dito sobre o felino: "Ô lá em casa". Com razão.




terça-feira, 8 de julho de 2014

De goleada

O Brasil mostra nas redes sociais a criatividade que não teve em campo. Ainda durante o primeiro tempo contra a Alemanha, o Facebook foi inundado de trocadilhos sobre a avassaladora goleada do time europeu. Perdemos a Copa, mas não a piada.

É da nossa cultura esse morrer de rir até na derrota, a autodetonação que implode dentro de nós mesmos o que há de tristeza, desesperança e desânimo. Bola pra frente que atrás vem gente!

Mas amanhã vem a quarta-feira de cinzas, com a ressaca do que poderia ter sido, a final redentora em pleno Maracanã - que poderá parar na mãos dos eficientes alemães, dos alegres holandeses ou ainda, sina deste mundo, dos hermanos argentinos.

Inédito esse 7x1 sobre a equipe chorosa do Felipão - que num lance de mestre assumiu na coletiva de imprensa a responsabilidade da derrota, honrando assim os parcos cabelos brancos.

Foi a Copa mais cara, mais midiática, mais cheia de mimimi do Brasil. A Copa das Copas, cantada em prosa e jingles pelo governo, pela imprensa e pelo povo. Começou no orgulho ufanista do verde e amarelo e cresceu feito tsunami para arrebentar na praia num caldo inesquecível.

Levanta, gigante, e vamos em frente. É só um jogo de futebol.


quarta-feira, 25 de junho de 2014

A historinha do Zé

O Zé não tinha nada de especial. Mas era esperto e tinha ambição. O pai era meio matuto mas besta que só e criou pra si mesmo um apelido de Sir, como o dos lords ingleses. O Zé que não era bobo se empertigou na vida e foi fazendo tudo certo: os amigos certos, andando com gente que tinha posses e poder. Tão bom ficar encostadinho na fartura de outro. Aí o Zé deu um jeito de entrar no serviço público e virou político. Em terra de cego - e a terra do Zé tinha carência de tudo - ter um olhão gordo como o dele pode levar a pessoa muito longe. E não é que levou? O Zé foi subindo na vida, galgando com artimanhas e maracutaias, alianças e indecências o caminhozinho longo até o cume. Chegou à presidência da República. É. Vestiu o fardão da Academia Brasileira de Letras. Acredite. Ano após ano, cercado de gente que quer seu ganha pão fácil e pela ignorância dos que não têm nada, eleição após eleição, se manteve no alto, nas fotos dos poderosos, indenpendente de quem lá estivesse - militar ou civil, democrata ou comunista. Não importa a ideologia, importa o poder. O Zé fez 84 anos, resolveu que estava na hora de parar. Já tinha deixado uma riqueza tão grande pra família que duraria gerações. Os filhos todos envolvidos nos esquemas e quase tão poderosos como ele. O Zé rodeado de fartura - mansões, ilhas, prêmios, arte - naquela mesma terra, tadinha, onde o povo pode dizer que "farta" tudo. Um dia o Zé morre. É imortal de fardão, mas morre. E na finitude humana dele, vai ter que prestar conta - com Deus? com a História?


terça-feira, 24 de junho de 2014

Sobre implicâncias e chatices

Ser mãe tem desafios diários. Eu, pelo menos, boto minha capa de heroína e tento resolver as coisas da melhor forma. E, como reles humana, quebro a cara muitas vezes. Exemplo recente: o que fazer quando a filha de 11 anos conta das chacotas de uma colega de classe?

Dá vontade de tirar satisfação, rodar a baiana na escola, confrontar a família da agressora? Sim, dá sim. Mas dá e passa. Porque mãe que é mãe tem que ter a cabeça no lugar e (tentar) agir de forma sábia. Pelo menos esse é o meu lema.

Então eu converso e mostro que apelidos, implicâncias e chatices assim são a coisa mais comum do mundo escolar, acontece com quase todos nesta fase da vida e aos poucos vamos aprendendo a ser menos agressivos, mais solidários, menos competitivos e carentes - e mais fraternos. Será? É o que espero.

Explico que o mundo não é o ninho de afeto e acolhimento em que ela vive em casa. Que a vida pode ser dura, às vezes cruel, e muita gente com quem esbarramos no caminho é assim - uma pedra inoportuna que tem que ser enfrentada de alguma forma. Cada um descobre a sua forma - mas não adianta fugir da pedra, ela fica lá, à sua espera.

Criar menina, neste aspecto, talvez seja mais difícil do que ter um filho. Porque os meninos resolvem às vezes suas diferenças no braço, sem culpa; ou numa partida com bola, em campo. A agressividade é extravasada mais naturalmente. Meninas, não. Sabem ser cruéis com um sorrisinho no rosto, buscando popularidade e aceitação no grupo. Sei do que estou falando: já fui menina, acredite.

Muitas vezes, por trás do valentão da escola, da gatinha cruel e popular está uma história familiar complicada, uma trajetória de violência e abandono - ainda que cercada de luxo e consumo.

Filhote humano se lança fora do ninho e descobre que colega não é amigo; que convívio diário não é lealdade. Faz um voo curto e se machuca um pouco. Fazer o quê? Vamos cuidar dessa asa e rir um pouco disso tudo que é a vida.




sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Do Rio a Campos

Em julho de 2012 nos mudamos, nós a pequena família de três membros, para Campos, no interior do estado. Motivos profissionais nos trouxeram e de lá para cá muita coisa mudou.

Nossa filha segue o curso natural da vida e cresce, e cresce, ultrapassa o 1,50m de altura aos 10 anos e faz perguntas e comentários desconcertantes e mágicos, uma janela aberta para um ponto de vista cheio de frescor e sabedoria jovem.

Nosso pacato Zucca, amigo canino de muitos anos, partiu para o céu dos cachorros há um ano agora. E deixou saudade.

Fomos acolhidos na nova cidade por uma casa deliciosa, um bairro calmo e bonito, colegas de trabalho generosos e amigos novos que já parecem eternos. Se lá na capital ficaram Lili, Claudinha, Monica, Barbara, Luce (e mais longe ainda Paola), aqui (re)encontrei Erika, Camila, Soraya, Dulce, Sonia, Cláudia, Vivi, Micaela...

É a roda da vida, que segue seu rumo, e nos leva a todos, com as bênçãos de novos amigos, novos destinos, e graças a Deus, o nosso trio fechado no ninho.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Santos católicos na Parada Gay de São Paulo: desrespeito

Foi com espanto e decepção que vi o uso na Parada Gay de São Paulo, realizada em 26/junho, de enormes galhardetes com fotos de modelos masculinos caracterizados como santos católicos. Caracterizados, não. Descaracterizados. As imagens erotizadas traziam jovens musculosos semidespidos reproduzindo mais de uma dezena de santos, entre eles São Sebastião, o guerreiro padroeiro do Rio de Janeiro.

Senti-me agredida como católica ao ver as fotos na imprensa dos tais galhardetes. Além da banal necessidade de criar polêmica - ou, na gíria gay que a novela das 9 da Globo reforça tanto, "ser um bafo" - o uso da imagem de santos é, no mínimo, desrespeitosa.

Por que é preciso reduzir o valor do outro para que o nosso mesmo valor seja imposto? Lembro-me de uma cena patética na TV, há muitos anos, quando um pastor da Igreja Universal, no afã de passar a sua mensagem evangélica, chutava sem dó nem piedade a pobre imagem de uma Nossa Senhora de Aparecida.Chutava a imagem da santa e dava um bico no respeito ao próximo. Essa cena entrou para o imaginário nacional como exemplo notório de desrespeito.

Infelizmente, a mesma tática de guerrilha foi usada na Parada Gay. Logo na Parada Gay, organizada por cabeças que se dizem pensantes e arejadas, gente que defende uma sociedade inclusiva e sem preconceito. Atacar ícones de uma religião não trará benefícios à causa defendida por aquela comunidade. Para se ter respeito é preciso, antes de tudo, saber respeitar também. Como será que foi decidido o uso dessas imagens? Será que os cidadãos que organizam a festa não avaliaram o impacto que essa escolha teria? Ou simplesmente acreditam que, na luta pelos próprios direitos, vale tudo, até mesmo desrespeitar o direito alheio?

"Amai-vos uns aos outros" é a Boa Nova que Cristo trouxe e com certeza é um mandamento dificílimo de se seguir. Como é difícil amar o outro - a despeito de todas as diferenças, de todos os erros, de todas as mágoas. E a cada demonstração de intolerância - racial, sexual, religiosa - parece que estamos nos distanciando cada vez mais desse mandamento.

Nessas horas de desencanto e dúvida filosófica, busco amparo no meu santinho, São Francisco de Assis, todo puro com as pombinhas nas mãos. E ele, sábio, me responde em silêncio: "É dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado".

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Olha o funileeeiro!

Outro dia ouvi em uma rua do bairro: "Olha o funileeeiro!". Em 2011, em plena cidade do Rio de Janeiro, um senhorzinho empurrava seu carrinho, com ferramentas e apetrechos, e anunciava a plenos pulmões sua profissão: "Funileeeiro!"

Funileiro é o profissional que confecciona e repara peças em metal. Hoje, funilaria lembra conserto de carros, os "martelinhos de ouro" que reparam pequenas batidas na lataria. Mas, na minha infância, em uma cidade do interior, funileiro era quem consertava as panelas da minha avó.

As panelas, de alumínio, compradas há muito tempo, eram usadas diariamente na hora do almoço e jantar. Comer fora, em restaurante, só em datas muito especiais. Eram lavadas e caprichosamente areadas, com palha de aço, sabão e muque. Minha avó as colocava para secar numa geringonça que parecia um protótipo da Torre Eiffel. As panelas ficavam à tarde no quintal, pegando sol e refletindo luz.

Quando precisavam de algum reparo - trocar a alça, desamassar a tampa - era só usar os serviços do funileiro.  Ele passava, regularmente, pela rua, gritando "Funileeeiro!" e as donas de casa levavam a panela na rua mesmo, e ali ele fazia o seu serviço. Era mais barato consertar a panela do que comprar uma nova. Não havia essa oferta de hoje de produtos e marcas, o crédito não era tão farto, na cidade não existia loja de departamento com pagamento em 10x sem juros.

As coisas eram feitas para durar naquela época. As panelas. As tradições. Os casamentos. As famílias. Se havia um problema, não se jogava fora, apenas fazia-se um reparo. E a vida seguia adiante, com remendos, mas plena de funcionalidade.