terça-feira, 28 de junho de 2011

Santos católicos na Parada Gay de São Paulo: desrespeito

Foi com espanto e decepção que vi o uso na Parada Gay de São Paulo, realizada em 26/junho, de enormes galhardetes com fotos de modelos masculinos caracterizados como santos católicos. Caracterizados, não. Descaracterizados. As imagens erotizadas traziam jovens musculosos semidespidos reproduzindo mais de uma dezena de santos, entre eles São Sebastião, o guerreiro padroeiro do Rio de Janeiro.

Senti-me agredida como católica ao ver as fotos na imprensa dos tais galhardetes. Além da banal necessidade de criar polêmica - ou, na gíria gay que a novela das 9 da Globo reforça tanto, "ser um bafo" - o uso da imagem de santos é, no mínimo, desrespeitosa.

Por que é preciso reduzir o valor do outro para que o nosso mesmo valor seja imposto? Lembro-me de uma cena patética na TV, há muitos anos, quando um pastor da Igreja Universal, no afã de passar a sua mensagem evangélica, chutava sem dó nem piedade a pobre imagem de uma Nossa Senhora de Aparecida.Chutava a imagem da santa e dava um bico no respeito ao próximo. Essa cena entrou para o imaginário nacional como exemplo notório de desrespeito.

Infelizmente, a mesma tática de guerrilha foi usada na Parada Gay. Logo na Parada Gay, organizada por cabeças que se dizem pensantes e arejadas, gente que defende uma sociedade inclusiva e sem preconceito. Atacar ícones de uma religião não trará benefícios à causa defendida por aquela comunidade. Para se ter respeito é preciso, antes de tudo, saber respeitar também. Como será que foi decidido o uso dessas imagens? Será que os cidadãos que organizam a festa não avaliaram o impacto que essa escolha teria? Ou simplesmente acreditam que, na luta pelos próprios direitos, vale tudo, até mesmo desrespeitar o direito alheio?

"Amai-vos uns aos outros" é a Boa Nova que Cristo trouxe e com certeza é um mandamento dificílimo de se seguir. Como é difícil amar o outro - a despeito de todas as diferenças, de todos os erros, de todas as mágoas. E a cada demonstração de intolerância - racial, sexual, religiosa - parece que estamos nos distanciando cada vez mais desse mandamento.

Nessas horas de desencanto e dúvida filosófica, busco amparo no meu santinho, São Francisco de Assis, todo puro com as pombinhas nas mãos. E ele, sábio, me responde em silêncio: "É dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado".

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Olha o funileeeiro!

Outro dia ouvi em uma rua do bairro: "Olha o funileeeiro!". Em 2011, em plena cidade do Rio de Janeiro, um senhorzinho empurrava seu carrinho, com ferramentas e apetrechos, e anunciava a plenos pulmões sua profissão: "Funileeeiro!"

Funileiro é o profissional que confecciona e repara peças em metal. Hoje, funilaria lembra conserto de carros, os "martelinhos de ouro" que reparam pequenas batidas na lataria. Mas, na minha infância, em uma cidade do interior, funileiro era quem consertava as panelas da minha avó.

As panelas, de alumínio, compradas há muito tempo, eram usadas diariamente na hora do almoço e jantar. Comer fora, em restaurante, só em datas muito especiais. Eram lavadas e caprichosamente areadas, com palha de aço, sabão e muque. Minha avó as colocava para secar numa geringonça que parecia um protótipo da Torre Eiffel. As panelas ficavam à tarde no quintal, pegando sol e refletindo luz.

Quando precisavam de algum reparo - trocar a alça, desamassar a tampa - era só usar os serviços do funileiro.  Ele passava, regularmente, pela rua, gritando "Funileeeiro!" e as donas de casa levavam a panela na rua mesmo, e ali ele fazia o seu serviço. Era mais barato consertar a panela do que comprar uma nova. Não havia essa oferta de hoje de produtos e marcas, o crédito não era tão farto, na cidade não existia loja de departamento com pagamento em 10x sem juros.

As coisas eram feitas para durar naquela época. As panelas. As tradições. Os casamentos. As famílias. Se havia um problema, não se jogava fora, apenas fazia-se um reparo. E a vida seguia adiante, com remendos, mas plena de funcionalidade.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Nina e Tico

Desde o Natal temos em casa dois novos habitantes, Nina e Tico. Sou a responsável pela limpeza do espaço que os dois ocupam e nessa hora observo, como num Big Brother doméstico, o relacionamento dos dois. A maior parte do tempo é um convívio tranquilo. Assim como na casa dos brothers da TV Globo, não há muito para Nina e Tico fazer, além de comer, dormir e malhar. Não sei se eles batem papo cabeça ou besteirol, porque infelizmente não entendo o idioma dos dois.

Nina é morena e roliça e passa a maior parte do tempo comendo, dormindo e fazendo muito exercício de corrida. Tico é louro, esguio e praticamente só come e dorme - quando ele tenta usar a academia do cômodo que compartilha com Nina, ela o empurra com seu quadril opulento ou, como fez outro dia, lhe dá umas mordidas. E são mordidas bem dadas, que deixaram marcas na barriga do sedentário Tico. Depois desse episódio, passei a duvidar se aquele confinamento a dois iria dar certo.

Mas, como disse Camões e cantou Renato Russo, "o amor é fogo que arde sem se ver, é ferida que dói e não se sente". Dias depois do entrevero, tendo superado suas desavenças e seguindo o caminho natural das coisas, lá estavam Tico e Nina em pleno amor. Os dois acordaram colegas e foram dormir um casal, com direito a soneca agarradinhos, no minúsculo quarto.

Ah, os mistérios do amor! Ah, as armadilhas da natureza... Talvez em breve tenhamos novos pequenos moradores na casa, uma família pode estar a caminho. E o milagre da vida se faz mais uma vez. A propósito, Nina e Tico são hamsters - mas isso, a esta altura da história, é apenas um detalhe.